sábado, 21 de janeiro de 2017

DA LÍNGUA PORTUGUESA


Esbanjamos as palavras até à míngua,
rudes garimpeiros de águas turvas;
na verdade, maltratamos a língua,
vendemo-la e estamos aqui p’ras curvas.

Essa que os eruditos dizem de Camões
e aos poetas dá tantas dores de cabeça,
anda por aí aos acordos, aos encontrões,
fingindo não haver mal que lhe aconteça.

No escrever e no falar é dor d’alma,
ver a língua tratada de qualquer maneira:
ao bom senso não se dá a palma
e no fim ou entra mosca ou sai asneira.

Também os tempos verbais e as corruptelas
já não dão para ninguém ficar calmo,
até um dia andarmos às apalpadelas
e pagarmos, bem pago, com língua de palmo.

Uns, porque o que mais importa
é que, em síntese, a gente se entenda;
outros, porque das regras fazem letra morta,
não tardará quem ponha a língua à venda.